segunda-feira, 28 de março de 2011

A gente não pede perdão quando existe o amanhã

Um dia ele esqueceu de te ligar no horário que costuma ligar. Também ele tinha muita coisa pra ser feita, entre os trabalhos, os projetos e a arrumação da casa. Tudo aquilo que você adia não porque você é desleixada, que no fundo é um sacrifício enorme pra você passar por cima disso tudo e ignorar a desordem da sua vida mas que você faz feliz para poder ligar pra ele e estar pronta pra receber o telefonema dele porque vale a pena. De alguma forma você acha bem feito pra si mesma, afinal quem mandou ter sido tão imprudente? Quem mandou ser bacana e doce e prestativa e pró-ativa? E quem mandou você não saber que as pessoas são assim? A culpa é sua, claro que é. No fundo muito da sua vontade de ser meiga o tempo todo, e simpática com todo mundo, e cordial com os injustos, é um jeito que você descobriu pra amenizar a sua culpa. Agora você não pode mais atrapalhar nem causar transtorno a ninguém e inclusive você deve tomar pra si os problemas dos outros, ainda que sejam desconhecidos e dar um jeito de resolve-los. Também... Quem mandou? Esse seu corpinho que de três meses pra cá borbulhou de celulite, essa dobrinha nas costas e a barriga que não merece descrição? você sabe porque foram até onde foram, e acordar de madrugada pra malhar por mais que você deteste academia e qualquer coisa sem função imediata, é pouco. Você precisa fazer mais, você precisa sofrer um pouco mais, e talvez não seja o suficiente. Ecoa na lembrança que você merece, e não se deixe emagrecer, não se deixe melhorar, não se deixe ir tão longe. Daí vem sua vontade de querer recomeçar, daí sua vontade de viver de um jeito mais simples, de andar com roupas feitas em casa e cultivar a própria comida. A tentativa de se refazer, de se perdoar e seguir em frente parece mais fácil que olhar para dentro de si e aceitar a perda que provocou. A culpa é sua, e decepcionar dói. Não queira fugir de si, não queira simplesmente esquecer, não queira morrer por isso. Respire fundo, durma tecnicamente bem e bola pra frente. Voce pode não se perdoar tão breve, mas amanhã a vida dá mais um dia pra você botar em prática aquilo que realmente gostaria de ser e o bem que gostaria de fazer.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Do not forget

- Desenho de pessoinhas
- Molduras
- Irmãs gêmeas
- Mini comidinhas
- Scarf
- Meias
- Flor
- Sementinha
- Novos sabores
- Antigos sabores
- Spark
- Óculos
- Manhã
- Sol no frio
- Textura de corpo
- Cumbuca

quarta-feira, 16 de março de 2011

Crer-Ser

Assim que ela decidiu ser feliz, foi logo até a gaveta da estante com espelho grande, oval e um pouco torto, cortou os cabelos de um jeito que sempre teve vontade e nunca havia tido coragem. Passou batom, vestiu um casaco longo de couro que deveria dar cnta do frio e antes de sair pela porta desajeitou o cabelo, para que então o corte tivesse sentido e sua vida se refizesse. Ela era nova. Ela saiu e fez o caminho contrário ao habitual, e de alguma forma foi a primeira vez que sentia ir para o lado certo. Em sua mochila não havia muita coisa, mas não era só isso que fazia com que ela parecesse mais leve que sua bolsa de mão de todos os outros dias que passaram. Com ela, alguns pares de meia, um pouco de dinheiro e o amor. Umas linhas de costura e botões coloridos. Um guia prático de como fazer, mas que ainda mal tinha sinais de uso. Não importava muito que não houvesse um plano. Tempo para plano ela sempre teria. Não importava que estava sem guarda-chuva.
Mas não foi muito longe, na verdade. Alguns quarteirões a frente e se via ligada ao presente.Tão presente, que nem mesmo determinada a deixá-lo para trás, foi capaz de vê-lo no passado. Não pelos procedimentos, não pela roupa branca, não também pelas pessoas. Definitivamente não por qualquer outra razão que não ela mesma. Havia um sonho prévio, e era o sonho de descobrir a razão de tudo aquilo até agora. Não era lá que ela deveria permanecer, mas era lá que ela deveria descobrir, e portanto é nisso que seria preciso persistir. Por sorte ainda estava em tempo de entrar para o próximo período. E então correu para a sala, sentou-se ao fundo para não atrapalhar aos demais e a si própria, e pôs-se a planejar a próxima saga, mas dessa vez, não seria a fuga de si mesma, seria a busca do mundinho que criou um dia e guardou no caderninho.

quarta-feira, 2 de março de 2011

O que eu espero

Eu me assusto quando me confundo com o que eu faço. Ser uma profissão não me parece grande coisa dentro do que eu faço, embora ser alguém, uma pessoa responsável, um humano coerente e sentimental dentro de uma profissão pareça bonito e muito profundo. Ser pintor é inanimado, as vezes é só um bom pincel, ter um coração pintor que cria e renova é que deve ser legal. Ser médico é ter um guarda pó e um estetoscópio, ter um coração médico é amar alguém e dar todo o seu esforço por esse alguém, e alguém que é conhecido, porque se o médico não conhece o paciente dele, ele é só o guarda pó e o estetoscópio.
Eu tento ouvir o que meu coração quer que eu seja, mas tento botar meu cérebro de frente pra ele, pra que eles descubram juntos pra onde eu devo canalizar meu amor e como fazer dinheiro com isso, embora cada vez menos eu pense no dinheiro.
O que sei é que eu não deito cedo a toa, eu não me afasto ou me isolo a toa. Minha profissão faz um pouco disso por mim nesse momento, meu corpo pede um pouco disso agora, mas mais que isso, meu coração fica tímido onde muita gente fala, e fica muito difícil escutar o que ele diz, ainda mais na língua que ele fala, para a qual eu ainda sou iniciante com pé no básico I.
Eu espero, e eu não espero parada. Meu coração está se empenhando muito e dando o máximo de si pelas pessoas que se colocam diante dele, tem batido mais forte pra dar conta de bombear diagnósticos, orientações e estratégias facilitadoras, mas a noite ele volta a bater de acordo com o que meu peito aguenta, e o que meu peito aguenta agora é a espera ansiosa, é o silêncio e a busca pela roupa e o instrumento certo que ele deve usar pra se refugiar e seguir em frente.